a janela escura do quarto não me vê
os pares de meia não me alcançam mais
na cama se perdem os sonhos em pés
e calados tentam não me acordar
eu subo as calças sem razão
tateio nas roupas os restos de alguém
embaixo do forro o passado ri
fica à espreita pra me devorar
na louça suja eu bato sem querer
encontro no ralo o verão
os dias de ontem esmagados
escalam a pia pra se salvar
na terça-feira eu lavo cabelo
nos outros dias procuro os fios
espalho-os de novo pela cabeça
mas o espelho os tira do lugar
as portas da casa sozinhas se fecham
no desespero das teias de pó
esperam o mofo tentar sair
e um domingo de sol pra aceitar